Imaginemos, uma espécie de Moneypenny da banda mais importante da pop.
Em querendo, Freda Kelly podia estar milionária há umas boas décadas.
Bastava-lhe deixar escapar aqui e ali uns quantos segredos a troco de
uns cobres - ou publicar umas colecções de memórias que quando em vez - e
estava feito. Nada disso. Freda é, para todos os efeitos, a melhor
amiga dos Beatles. Assim sendo, amigo não trama amigo, é feio e não se
faz.
A secretária do grupo nunca falou sobre o que viu e ouviu, até
agora, num documentário apresentado em primeira mão no festival South by
Southwest (SxSW). Se já existiam razões para querermos estar em Austin,
esta é só mais uma.
“Good Ol’ Freda” é o nome do filme e a própria esteve na cidade texana
no dia da estreia. Disse na apresentação: “Quando o clube de fãs dos
Beatles acabou em 1972, já a banda tinha terminado, não queria mais
aquela vida, queria apenas tomar conta da minha casa e da minha família.
E pensei que o assunto estava arrumado.” Longe disso. Diz-nos a
história feita até aqui que haverá enredos com Beatles dentro durante
muito tempo. Ainda que, na verdade, Freda Kelly tenha dado em
protagonista de um documentário quase por acidente.
Ryan White, o realizador de “Good Ol’Freda” (autor também de “Pelada”, o
filme de 2010 que acompanhava jogos de futebol nos locais e com os
jogadores menos populares mas mais prováveis, de uma prisão na Bolívia
às aldeias do Irão, com equipas femininas), conheceu Freda através do
tio, Bill Kinsley, músico que fez parte dos Merseybeats, de Liverpool.
Mas durante muito tempo, Kelly era apenas isso, uma amiga do tio. Depois
de descoberto o quase-segredo, o realizador apressou-se a convencer a
antiga secretária. Ou a aproveitar-se da mudança de ideias de Freda, que
quase nos 70, resolveu registar a sua sorte para o neto.
O resultado de 40 horas de entrevistas está longe de ser a história dos
Beatles. Explica Ryan White, citado pelo “Los Angeles Times”:
“ Isso já
toda a gente conhece. Esta é uma história pessoal, as experiências de
Freda enquanto colaboradora dos Beatles. Nunca foi contado, ninguém
conhece estas memórias porque a Freda nunca as contou.”
E fazendo contas, Freda deverá ter uma boa colecção de relatos.
Começou
a trabalhar para os Beatles apenas com 17 anos. Na altura, a morada do
clube de fãs era a da sua própria casa, até que o pai de Freda decidiu
que tamanha quantidade de papel teria que ser encaminhada para outro
local - no auge da beatlemania, o clube de fãs recebia entre duas a três
mil cartas por dia. Esteve dez anos com o grupo e acompanhou os quatro
magníficos do palco suado do Cavern Club até às visionárias investidas
em estúdio.
Kelly trabalhou nos escritórios do manager Brian Epstein. As
suas tarefas poderiam variar entre a entrega de pagamentos semanais aos
músicos e a recolha de mechas de cabelo das estrelas, para enviar pelo
correio para as fãs mais merecedoras de tal honra.
A dada altura, em “Good Ol’ Freda”, Ringo Starr diz algo como “ela era
parte da família”.
E recordam-se momentos inesperados, como a súplica de
Lennon, ajoelhado, pedindo à sua secretária que voltasse, depois de a
ter despedido (Freda tinha estado a beber uns copos com outra banda, não
se faz). Esperamos ansiosamente por conhecer todas as aventuras, é
quase uma obrigação.
www.goodolfreda.com
Por Tiago Pereira, publicado em 13 Mar 2013, no I
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