segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Eric Clapton, a autobiografia.

Independentemente do facto de concordarmos ou não com as célebres pixações "Clapton is God" que surgiram em Londres no fim dos anos 60, o facto é que este inglês de aparência pacata continua, após quase cinco décadas, com grande sucesso no mercado musical . Boa parte dessa história é contada, de forma bastante eficiente por sinal, na sua autobiografia, já lançada no Brasil, em português, portanto pela Editora Planeta.

Talvez poucos músicos tenham feito de forma tão perfeita a transposição entre o blues e o rock quanto Eric Clapton. Tendo participado de grupos seminais como The Yardbirds (do qual fizeram parte também Jeff Beck e Jimmy Page), John Mayall’s Bluesbreakers e Cream (junto a dois outros monstros sagrados, Jack Bruce e Ginger Baker); de projectos breves mas que marcaram a história da música de forma indelével, como Derek and The Dominos (com Duane Allman, da Allman Brothers Band) e Blind Faith (com Steve Winwood, do Traffic); e tendo desenvolvido desde então uma carreira solo de grande sucesso, Clapton certamente tem muita história para contar. E contou, sob a sua perspectiva, neste livro.

É importante frisar que o enfoque principal da obra não é o aspecto musical da sua carreira, mas sim o aspecto pessoal. Claro, a música está sempre presente na narrativa, e não poderia deixar de ser, mas o que transparece é mesmo que o guitarrista tinha uma espécie de necessidade de deitar para fora todos os seus demónios, do tipo, processo de "limpeza geral" que a sua vida tem sofrido nos últimos anos.

De qualquer forma, é fascinante entender como uma personalidade como a de Clapton foi sendo moldada ao longo dos anos, e vários nomes que vão surgindo são, obviamente, bastante conhecidos: Chris Farlowe, John Lennon e Yoko Ono, George Harrison, Mick Jagger, Ron Wood, Roger Waters, Phil Collins, Albert Lee, Bob Dylan, Mick Fleetwood, John McVie, Alexis Korner, Jimi Hendrix. Não deixa de ser um relato (ou pelo menos uma visão) de como a cena rhythm’n’blues e, depois, blues/hard rock, foi tomando forma em Inglaterra, especialmente.

Clapton passa a idéia de nunca ter inteiramente compreendido toda a veneração pelo seu nome, manifestando uma reacção dupla em relação a isso, por vezes negando-a e por vezes simplesmente aproveitando o momento. Histórias como a da pixação de "Clapton is God", ou de como surgiu o seu apelido "slowhand", ou sobre a sua paixão por Pattie Boyd (esposa de George Harrison), são narradas no livro, de certa forma desmistificando a sua figura.

A sua visão pessoal da cena inglesa (e norte-americana) do final dos anos 60 e início dos 70 ajuda-nos a melhor compreender como tudo se desenrolou. Ele cita, por exemplo, que seu estilo diferia do de Page e Beck, pois eles eram mais influenciados pelo rockabilly, enquanto que ele tinha raízes mais profundas no blues.

Chega a ser impressionante (e louvável) a forma extremamente sincera com a qual Clapton trata no livro de temas polémicos, como o consumo de drogas e álcool de forma desenfreada, que quase o mataram em algumas ocasiões, entre outras questões. Vários dos relatos são oriundos de anotações de seu próprio diário.

Tragédias não ficaram de fora, como a morte de seu filho Conor, assim como as de Jimi Hendrix e Stevie Ray Vaughan.

Não é um livro pequeno (são quase 400 páginas), mas é uma leitura tão fluida e fácil que de forma alguma se torna cansativa. Mais um trabalho bem feito de um artista que dá a si próprio menos créditos do que merece (e do que recebe dos outros).

Por Rodrigo Werneck

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