quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O processo que destruiu a carreira de Wilson Simonal,


Nenhum artista sofreu uma perseguição política e foi inapelavelmente condenado pela ala esquerdista encravada na cultura brasileira do que Wilson Simonal. Nascido em 1938 no Rio de Janeiro e filho de uma empregada doméstica, Wilson Simonal de Castro começou a cantar quando ainda era cabo do Exército Brasileiro.

O seu repertório nesta época, 1961, baseava-se em calypsos e standards americanos, sendo acompanhado pelos conjuntos Dry Boys e Os Guaranis. Após uma apresentação no programa de TV "Os Brotos Comandam", apresentado por Carlos Imperial, foi logo contratado para actuar nas melhores casas nocturnas de diversão, como o Drink , e o Top Club. Daí para o famoso Beco das Garrafas, reduto da bossa nova, foi um pulo, levado pela dupla Luis Carlos Miéle e Ronaldo Bôscoli.

Cantor de inesgotáveis recursos vocais, bom músico e dotado de um excepcional senso rítmico e divisão musical, Wilson Simonal começou a fazer nome e a ganhar estilo próprio, juntamente com o crescimento da Bossa Nova, no meio a uma geração de músicos, compositores e cantores que iriam compor aquilo que se convencionou chamar de MPB, Música Popular Brasileira.

Entre 1966 e 1967, apresentou o programa "Show em Si...monal", na TV Record de São Paulo, revelando-se aí um grande showman com perfeito domínio das plateias. É desta época que acompanhado do excelente trio Som Três (César Camargo Mariano, Sabá e Toninho) liderou um movimento bastante swingado, logo catalogado de pilantragem, idealizado por Carlos Imperial e que juntava elementos do samba e da soul music.
Os seus grandes sucessos na época eram "Meu Limão, Meu Limoeiro", "Vesti Azul", "Mamãe Passou Açúcar em Mim", "País Tropical", "Sá Marina", entre tantos outros. Em 1970, Simonal atingira o topo na MPB. Era o artista mais aclamado e bem pago do show business Brasileiro. Acompanhou a Seleção Brasileira de futebel na Copa do México, tendo se tornado amigo de vários jogadores tri-campeões como Jairizinho e Carlos Alberto Torres.

A sua imensa capacidade de comunicar com as massas, o assédio popular e da imprensa, tornou-o no artista preferido do governo militar que o escolheu para actuar em alguns espectáculos públicos. Isso irritou profundamente certos sectores esquerdistas da imprensa alternativa Brasileira, principalmente O Pasquim, que não poupava críticas corrosivas ao cantor, acusando-o de ser o cantor oficial do sistema, controlado pelos militares.



Mas por trás desta perseguição stalinista havia também outra leitura, originada pelo preconceito racista de parte da elite intelectual Brasileira, que não perdoava a um artista negro, que usava carros e roupas, que na época eram um luxo por serem importadas do estrangeiro e ainda por cima, era casado com uma mulher loura.

A derrocada de Simonal deu-se em 1971, quando o cantor foi vítima de um desfalque e demitiu o seu contabilista, o suposto culpado. Este moveu uma acção no tribunal de trabalho contra o cantor. Em Agosto de 1971, Simonal recrutou dois amigos (um deles era seu segurança) militares, para darem  "uma lição" ao contabilista. Ester foi torturado, inclusive com choques eléctricos, tendo a sua família sido ameaçada de morte. Afinal, acabou assinando a confissão de culpa no desfalque.
O que Simonal não contava era que a mulher do farçola tinha apresentado queixa na polícia pelo sequestro do marido. Quando este voltou para casa, a mulher convenceu-o a colocar outro processo contra Wilson Simonal.

Foi processado e acusado de extorsão e sequestro do contabilista. Simonal ainda levou como testemunha o policia, que o tinha denunciado como "bufo", denunciante, ao serviço da policia militar Brasileira, mas outra testemunha de defesa, um oficial do I Exército na época, afirmou que o réu colaborava assiduamente com o exército.

Simonal foi julgado culpado pelo sequestro e em 1972, condenado a uma pena de cinco anos e quatro meses, que cumpriu em liberdade. Nos autos, Simonal era referido como colaborador das Forças Armadas e informador do Dops, a policia do regime. Em 1976, num acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, também é referida a sua condição de colaborador do Dops.

Apesar de nunca ter sido provada nenhuma colaboração ou participação em acções que o ligassem á repressão militar, o meio artístico Brasileiro, juntou-se e apontou o dedo acusador contra Wilson Simonal. Foram poucas as vozes se levantaram a seu favor..

O humorista Chico Anysio e o jornalista Nelson Motta, entre outras personalidades, afirmam que até á presente data não apareceu uma vítima sequer das ditas denuncias de Wilson Simonal. O jornal O Pasquim, frente de luta contra a ditadura militar, através de pessoas como Ziraldo e Jaguar, ocupou-se de propagar as acusações que destruíram a carreira de Simonal. Quando foi questionado, por que é que não havia sido verificada a veracidade das informações, Ziraldo respondeu que não havia motivos para duvidar das fontes.

Wilson Simonal caiu em absoluto esquecimento a partir da década de 1980.

Dizia para mim: 'Eu não existo na história da música brasileira'", conta a sua segunda mulher, Sandra Cerqueira. Tornou-se um deprimido e um  alcoólatra, vindo a morrer com complicações decorrentes do alcoolismo em Junho de 2000.

Em 2002, a pedido da família, a Comissão Nacional de Direitos Humanos da Organização dos Advogados Brasileiros, abriu um processo para apurar a veracidade das suspeitas de colaboração do cantor com os órgãos de informação do regime militar. Além de depoimentos de artistas e de material enviado por familiares e amigos, existia no processo um documento de Janeiro de1999, assinado pelo então Secretário nacional dos Direitos Humanos, José Gregori, no qual este atestava que, após pesquisa realizada nos arquivos de órgãos federais, como o Serviço Nacional de Informações e no Centro de Informações do Exército (CIEx), não foram encontrados registros de que Wilson Simonal tivesse sido colaborador, servidor ou prestador de serviços daquelas organizações.

Em 2003, concluído o processo, Wilson Simonal foi moralmente reabilitado pela Comissão Nacional de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em julgamento simbólico.
Desmascarados em público, e sem nunca terem provado as acusações que faziam, os detractores de Simonal ainda tentaram, dez anos depois da sua morte, condená-lo novamente, apresentando um documento que nunca aparecera antes, e que demonstraria as ligações íntimas de Simonal com o regime militar. Mas depois provou-se que tal documento nada mais era do que uma tentativa de Simonal para escapar de um provável processo por agressões ao seu contabilista, invocando para isso ajuda oficial da polícia para provara  sua inocência.

Segundo Ricardo Alexandre, autor do livro "Nem vem que não tem - a vida e o veneno de Wilson Simonal", há motivos para os detractores de Simonal pensarem que ele era um boneco nas mãos da direita, pois cantou músicas como "Brasil, eu fico". Não há notícias, contudo, de uma pessoa concreta que tenha sido denunciada por Simonal. Afirma o mesmo Ricardo Alexandre que está coberto de razão quem compreende que foi crucificado pela esquerda numa campanha de difamação, pois foi vítima de uma "mídia inclemente atrás das manchetes".

Em 2009, foi lançado o documentário "Simonal - Ninguém sabe o Duro Que Dei", dirigido por Cláudio Manoe (da equipe do Casseta e Planeta), Micael Langer e Calvito Leal.
Segundo Cláudio Manuel, Simonal "pagou uma pena dura demais, desproporcional para uma surra, porque a sua condenação foi até ao fim da sua vida. Para ele, não houve "amnistia".

Fonte : Mestre Joca e Wikipedia

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